Maranhão encaminhou ofício ao presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), pedindo que os autos sejam devolvidos à Câmara.
O presidente da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP-MA), acatou nesta segunda-feira recurso ingressado pela Advocacia-Geral da União que pedia a anulação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Como a ação contra a petista já está no Senado, Maranhão encaminhou ofício ao presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), pedindo que os autos sejam devolvidos à Câmara.
A decisão surpreende a cúpula da Câmara dos Deputados – e causa estranhamento entre os parlamentares. Na última semana, a Secretaria-Geral da Mesa já tratava o recurso da AGU como prejudicado, já que a ação está em tramitação no Senado. A cúpula também entende que a petição ingressada por José Eduardo Cardozo não tinha poder para reverter uma decisão dada pelo plenário da Casa e chancelada por 367 deputados. “Não cabe mais ao presidente da Câmara tomar decisões em relação ao impeachment”, afirma o líder do Democratas, Pauderney Avelino (AM). Ele afirma que, se necessário, a oposição ingressará ainda hoje com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal contra a decisão de Maranhão.
Maranhão, no despacho, afirmou que ocorreram vícios que tornaram nula a sessão da Câmara que deu prosseguimento à ação contra Dilma. Em um argumento controverso, o novo presidente afirmou que os partidos políticos não poderiam ter fechado questão ou firmado orientação para que os parlamentares votassem de um modo sobre o afastamento da presidente da República. “No caso, deveriam votar de acordo com suas convicções pessoais e livremente”, escreveu.
“Não poderiam os senhores parlamentares antes da conclusão da votação terem anunciado publicamente os seus votos, na medida em que isso caracteriza prejulgamento e clara ofensa ao amplo direito de defesa que está consagrado na Constituição. Do mesmo modo, não poderia a defesa da senhora presidente da República ter deixado de falar por último no momento da votação, como acabou ocorrendo”, continuou Maranhão.
A decisão de Maranhão anula as sessões realizadas nos dias 15, 16 e 17 de abril, quando foi discutido e votado o processo de impeachment, e determina uma nova sessão para julgar a ação no prazo de cinco sessões contadas a partir da data que o processo for devolvido pelo Senado à Câmara.
Outro ponto usado por Maranhão para anular a votação do processo de impeachment é que o resultado da sessão do último dia 17 de abril “deveria ter sido formalizado por Resolução, por ser o que dispõe o Regimento Interno da Câmara dos Deputados e o que estava originalmente previsto no processamento do impeachment do Presidente Collor, tomado como paradigma pelo STF para o processamento do presente pedido de impeachment”.
Como informa a coluna Radar, o governador do Maranhão, Flavio Dino (PCdoB), orientou a decisão de Maranhão. Dino esteve em Brasília no domingo e se reuniu com o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. Depois, conversou com Waldir Maranhão, que assumiu a presidência da Câmara na última quinta-feira, após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar o afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do comando da Casa e do mandato parlamentar. Na sexta-feira, Maranhão esteve na casa do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha. Investigado na Lava Jato, o deputado do PP teve reuniões com o ex-presidente Lula na véspera da votação do impeachment, quando votou contra a ação por crime de responsabilidade contra Dilma Rousseff. Como definiu nesta segunda a própria presidente, fingindo surpresa ao saber da decisão: “Tenham cautela porque vivemos uma conjuntura de manhas e artimanhas”.
Confira a seguir a íntegra da nota de Maranhão:
NOTA À IMPRENSA
1. O Presidente da Comissão Especial do Impeachment no Senado Federal, Senador Raimundo Lira, no dia 27 de abril do corrente ano, encaminhou à Câmara dos Deputados, ofício em que indagava sobre o andamento de recurso apresentado pela Advocacia-Geral da União contra a decisão que autorizou a instauração de processo de impeachment contra a Sra. Presidente da República, Dilma Rousseff.
2. Ao tomar conhecimento desse ofício, tomei ciência da existência de petição dirigida pela Sra. Presidente da República, por meio da Advocacia-Geral da União, em que pleiteava a anulação da Sessão realizada pela Câmara dos Deputados, nos dias 15, 16 e 17 de abril. Nessa sessão, como todos sabem, o Plenário desta Casa aprovou parecer encaminhado pela Comissão Especial que propunha fosse encaminhada ao Senado Federal para a eventual abertura de processo contra a Sra. Presidente da República, Dilma Rousseff, por crime de responsabilidade.
3. Como a petição não havia ainda sido decidida, eu a examinei e decidi acolher em parte as ponderações nela contidas. Desacolhi a arguição de nulidade feita em relação aos motivos apresentados pelos Srs. Deputados no momento da votação, por entender que não ocorreram quaisquer vícios naquelas declarações de votos. Todavia, acolhi as demais arguições, por entender que efetivamente ocorreram vícios que tornaram nula de pleno direito a sessão em questão. Não poderiam os partidos políticos ter fechado questão ou firmada orientação para que os parlamentares votassem de um modo ou de outro, uma vez que, no caso deveriam votar de acordo com as suas convicções pessoais e livremente. Não poderiam os senhores parlamentares antes da conclusão da votação terem anunciado publicamente os seus votos, na medida em que isso caracteriza prejulgamento e clara ofensa ao amplo direito de defesa que está consagrado na Constituição. Do mesmo modo, não poderia a defesa da Sra. Presidente da República ter deixado de falar por último no momento da votação, como acabou acorrendo.
4. Também considero que o resultado da votação deveria ter sido formalizado por Resolução, por ser o que dispõe o Regimento Interno da Câmara dos Deputados e o que estava originalmente previsto no processamento do impeachment do Presidente Collor, tomado como paradigma pelo STF para o processamento de presente pedido de impeachment.
5. Por estas razões, anulei a sessão realizada nos dias 15, 16 e 17 e determine que uma nova sessão seja realizada para deliberar sobre a matéria no prazo de 5 sessões contados da data em que o processo for devolvido pelo Senado à Câmara dos Deputados.
6. Para cumprimento da minha decisão, encaminhei ofício ao Presidente do Senado para que os autos do processo de impeachment sejam devolvidos à Câmara dos Deputados.
Atenciosamente,
Waldir Maranhão
Presidente em exercício da Câmara dos Deputados
(VEJA)