Um projeto realizado pela Fundação de Educação para o Trabalho de Minas Gerais (Utramig), em parceria com a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig) e o Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas Gerais (Idene), está mudando a realidade de moradores do Cerrado em todo o estado.
Por meio da instalação de unidades produtivas em diversos municípios na região Norte e da capacitação das comunidades locais para a exploração sustentável de espécies vegetais nativas do Cerrado, o projeto promove desenvolvimento e incremento da renda local, além de trazer impactos positivos na conservação da biodiversidade.
A última unidade produtiva foi recentemente implantada no município de São Francisco e hoje produz trufas, sorvetes e polpas com frutos do Cerrado, como explica o morador da cidade e presidente da Associação Comunitária Viver e Servir – que está à frente da gestão da agroindústria -, Antônio Carlos.
“Estamos trabalhando hoje com baru, maracujá do mato, umbu, tamarindo e pequi. Compramos agora uma máquina para fazer sorvete, que vai agilizar a produção”, conta.
Antônio Carlos relata que a associação, que existe desde 2008, funcionava em locais provisórios e trabalhava apenas com o fornecimento de hortaliças para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). “Houve uma mudança de 100% para nós moradores. Temos um espaço completamente apropriado para trabalhar e começamos a valorizar o que temos aqui mesmo no Cerrado, que pra nós era tão comum que não víamos como algo tão bom”, diz.
Barra de cereal
Outro produto que vem sendo produzido na agroindústria é a barrinha de cereal feita com o baru e o buriti. As polpas de frutas, que por enquanto são o carro-chefe da unidade, estão sendo compradas pelas escolas do município. Já as trufas de chocolate conquistaram o paladar da comunidade local, e não ficam paradas em estoque.
O coordenador do projeto na Utramig, Fernando Madeira, ressalta que o projeto envolve 2.680 famílias na região Norte do estado. A Utramig é responsável pela capacitação dos moradores para atuação nas unidades produtivas, a Epamig pelas pesquisas envolvendo os frutos e pelo diagnóstico socioambiental, e o Idene pela implantação e manutenção das agroindústrias. “É um trabalho sustentável, que traz mais renda para estas comunidades e mantém nossas florestas e rios”, destaca.
A agroindústria de são Francisco já tem Alvará de Funcionamento Sanitário Municipal, e agora busca o Alvará Federal, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Além de São Francisco, outros nove municípios já receberam as unidades produtivas: Arinos, Bonfinópolis de Minas, Chapada Gaúcha, Januária, Jatobá, Lontra, Mirabela, Montes Claros e Riachinho. Brasília de Minas e Coração de Jesus serão os próximos a receber o projeto.
Hoje, as agroindústrias trabalham, no total, com 300 espécies do Cerrado. Cada unidade tem atividades que apresentam maior potencial local, de acordo com a vegetação presente. Em Mirabela, por exemplo, a unidade realiza o beneficiamento da macaúba, palmeira nativa do Cerrado, cujo óleo é utilizado na fabricação do biodiesel.
“Há seis meses começamos uma parceria com a Petrobras, que compra este óleo. São produzidos 30 mil litros por mês em Mirabela”, comemora Madeira.
Além do óleo, a unidade produtiva local produz, com o resíduo do coco da macaúba, uma ração com alto valor proteico para alimentação de pequenos animais, como galinhas caipiras e suínos, e também sabão em pó, em barra e o sabonete do coco macaúba.
Produto para exportação
Antes da instalação das unidades produtivas, é realizado um extenso trabalho de diagnóstico e bioprospecção das plantas medicinais e frutos do Cerrado. Em São Francisco, os estudos mostraram o potencial de venda da fava d’anta, árvore que possui a substância rutina, utilizada pela indústria farmacêutica para a produção de medicamentos que melhoram a circulação sanguínea.
“Ocorria o extrativismo da planta de forma inadequada, com degradação do Cerrado e sub valorização do fruto, do qual é retirado o extrato. Mudamos a forma de manejo e capacitamos os extrativistas, para que eles vissem que a extração de forma sustentável renderia muito mais frutos e retorno para a região”, defende o coordenador do projeto na Utramig, Fernando Madeira.
O quilo da fava d’anta, antes vendido a R$ 0,10, hoje vale R$ 1,38. A quantidade extraída, por sua vez, aumentou cerca de seis vezes, e a produção é toda vendida para três empresas, sendo uma nacional, uma alemã e outra francesa.
Múltiplas possibilidades
Em São Francisco, o projeto prevê ainda a instalação de um sistema de criação de galinhas caipiras e a recomposição florestal de parte da margem direita do Rio São Francisco. Além disso, já foi implantada e funciona no local uma horta agroecológica, que garante o fornecimento dos legumes e hortaliças para o PNAE.
“Temos beterraba, alface, rúcula, couve, pimentão, muita coisa boa aqui. Começamos com quatro canteiros, estamos com 12 e queremos chegar a 36”, planeja o morador de São Francisco e presidente da Associação Comunitária Viver e Servir, Antônio Carlos. Hoje, oito moradores que foram capacitados ficam à frente da horta.
“Este projeto está transformando nossa realidade, tenho certeza que vai trazer uma mudança muito grande. Esse tipo de pesquisa também abre nossos olhos para valorizar o que temos aqui, sem contar a quantidade de atividades novas que temos. Trabalho tem para o ano todo”, conclui ele.
(Agência Minas)