Direto da Alemanha, onde vive atualmente, ex-secretário executivo da ZPEX, Arlindo Matias, diz ao minasreporter.com que ZPE ainda é um modelo muito viável de negócios
O ex-secretário-executivo da ZPEX, Arlindo Matias do Rêgo, hoje vive com a família na Alemanha. Mesmo à distância, é um apaixonado por Teófilo Otoni e não se cansa de buscar notícias da Cidade e de torcer por nossa gente. Na última semana Arlindo mostrou-se um leitor assíduo do minasreporter.com e até fez questão de deixar comentários em algumas de nossas postagens. Diante do anúncio recente do lançamento do Shopping Teófilo Otoni, e da intenção do prefeito Getúlio Neiva de dar alguma utilidade prática à ZPE até que seja efetivamente colocada em funcionamento, acionamos Arlindo, via e-mail, e ele, lá de Mildstedt, na Alemanha, concedeu-nos a seguinte entrevista:
minasreporter.com: Como é viver na Alemanha, o país mais rico da Europa e a 4ª economia mundial?
Arlindo Matias: Acho que, para muitos, o que se apresenta como seguridade pela qualidade de vida que se tem aqui, ou ao menos do que se vê para quem está inserido produtivamente com trabalho e gerando renda, é um sonho. É evidente que as condições são muito favoráveis… Mas sempre procuro obter desta experiência do pragmatismo alemão em termos de resultados, juntando a espontaneidade e, porque não dizer, o jeitinho brasileiro, para poder minimizar a saudade e a nossa alegria.
minasreporter.com: A sua família parece que tem gostado da vida aí. … A sua filha, inclusive, tem feito carreira como atriz com importantes papéis no cinema e na TV. Você é mais fã ou mais pai quando assiste o trabalho dela?
Arlindo Matias: Minha raiz com a Alemanha vem de meados dos anos 80. Portanto, antes da queda do muro de Berlin. De lá para cá a Alemanha tornou-se mais do que um país cosmopolita, e nisto surgem as oportunidades… Neste mundo está inserida a minha filha. Somos orgulhosos em ver que, desta nova geração de artistas (atriz), a nossa Cristina, que tem suas raízes também em Teófilo Otoni, é um dos destaques, e tem o seu espaço conquistado pelo valor do trabalho e estudo. Como pai e como ou fã incondicional, o coração sempre fica alegre ao ver o resultado de um novo trabalho e saber que ela tem orgulho, acima de tudo, de ser brasileira.
minasreporter.com: Agora vamos falar de Teófilo Otoni. Acaba de ser anunciado o lançamento do Shopping Teófilo Otoni, que os empreendedores, o Grupo SACS CONSULT, pretende inaugurar em dois anos. Como você vê esse anúncio?
Arlindo Matias: Vemos por aí grupos financeiros de porte que têm condições, sim, de bancar tais projetos… Entendo que esta não é a questão… O que acho que temos que entender é que nenhum setor de capital privado deste país, em um valor tão significativo, vai se expor com um capital tão alto sem uma contrapartida que compense o investimento. Particularmente, acredito que, enquanto a área não for viabilizada economicamente, não terá capital privado para um risco de investimento deste. E quero estar enganado! Em existindo o capital para esta infraestrutura, devemos tirar o chapéu, sim, para o prefeito e para a sua equipe. Esta é uma conquista pessoal… Agora, no tocante a investimento, é bom questionar. Este dinheiro vem do município ou do estado? Não me interessa aqui se o terreno é de A ou B acontecendo o que está noticiado no que diz respeito à geração de emprego e distribuição de renda. Eu penso que todos sairão ganhando. É claro que o fato de todo este desenvolvimento estar sendo direcionado para uma área pertencente a um expoente político gera dúvidas de favorecimentos. Também, tem alguém aí que pode fazer o mesmo? Acho até que tem… Porem, justificativas técnicas poderão inviabilizar o local! Além do mais, o poder político representativo pode facilitar algumas questões técnicas e burocráticas dentro dos órgãos públicos. Esta tem sido a praxe… Ao repassar tais informações e questionamentos não me vejo agindo de forma irresponsável ou desmerecedora. Acho que este instrumento de comunicação está aqui para que sejamos verdadeiros – e responsabilizados por aquilo que escrevemos… Se não existe mentiras nos fatos, ganharemos todos. Eu também quero a minha cidade melhor para o cidadão… Apesar de entender que o caminho para atingir uma melhor qualidade de vida seria outro.
minasreporter.com: A Prefeitura, como forma de incentivar a ZPE, quer instalar em suas dependências uma fábrica da empresa SOLAR PAR, que vai fabricar placas fotovoltaicas. Como você vê essa ideia. Isso pode ajudar a ZPE de alguma forma?
Arlindo Matias: Hoje parto do princípio que em se falando deste mecanismo, não se tem que discutir o que sempre foi objetivamente mal propagado através da pergunta: “quando a ZPE vai sair do papel?” ZPE não tem que sair de papel algum. ZPE tem que entrar. São projetos, linhas de investimentos, qualificação profissional, plano de impacto habitacional, impacto ambiental, educacional e outros , além de muito, muito planejamento. Ao que sei através da imprensa, este projeto deverá ser alocado no “distrito industrial” propagado pela atual administração, e não dentro da área da atual ZPE. Acho que ajuda, sim, associar. Quem sabe lá na frente esta mesma empresa pode ter um projeto específico para a área da ZPE?!
minasreporter.com: Você foi secretário-executivo da ZPEX Administradora por algum tempo. Com a autoridade de quem conhece do assunto, diga-nos, por favor, qual o maior entrave para o pleno funcionamento da ZPE?
Arlindo Matias: O histórico do mecanismo ZPE brasileiro vem de 88, por incrível que pareça, com as iniciativas do Sarney. As Zonas de Processamento de Exportação (ZPEs) foram criadas no Brasil pelo Decreto-Lei nº 2.452/1988, substituído recentemente pela Lei nº 11.508/2007 (com a nova redação dada pela Lei 11.732/2008), como instrumento destinado a contribuir para a consecução de um amplo e ambicioso conjunto de objetivos: a correção de desequilíbrios regionais, a geração de empregos, o fortalecimento do balanço de pagamentos e a difusão de novas tecnologias e métodos gerenciais mais modernos. A nossa ZPE em Teófilo Otoni vem de 94, com o decreto federal 1.276 de 13/10/94 do então presidente da república Itamar Franco… Da origem até a data de hoje temos que entender de que estamos falando de um instrumento de porte nacional, um modelo de abertura da indústria nacional até hoje mal compreendido. Os entraves sempre foram como adequar este modelo brasileiro de ZPE à nova ordem da economia mundial, e com isto surge a necessidade de aperfeiçoamento através de normas ministeriais que estremece com as paredes do Congresso Nacional (Câmara e Senado). O elemento ZPE de Teófilo Otoni tem suas particularidades devido, inicialmente, ao fato de ter caráter privado, e sempre houve um jogo de interesse político que quis se apoderar dela para o seu uso eleitoreiro. Como esta característica sempre existiu em nossa cidade, a minha busca foi uma forma de se oficializar a presença política administrativa… Nunca esqueça: o município de Teófilo Otoni tem em mãos um instrumento federal para efetuar uma política tributária favorável a segmentos industriais, e esta é a grande questão, o que não é um entrave.
minasreporter.com: A eterna briga dos políticos de Teófilo Otoni, onde um tenta impedir o mandato do outro de prosperar, atrapalhou a ZPE de alguma maneira?
Arlindo Matias: Como relatei há pouco, o embate político sempre foi de uma certa forma um entrave. Apesar de que os mesmos nunca tiveram nenhum poder real de mando administrativo dentro da administradora Zpex SA. Claro que, em alguns momentos, fomos omissos, nos posicionamos de forma política (hoje dentro do contexto histórico) errada. Mas todos sempre morreram de medo quando, para se levar qualquer discussão, qualquer composição administrativa ou legislativa, eu afirmava que gostaria da presença do Ministério Público na negociação. Você mesmo deve estar lembrado quando provoquei a Câmara Municipal para que se fizesse realmente uma CPI, colocar estas questões publicamente. Sim, esta falta de se falar a verdade e esta desarmonia política realmente atrapalham.
minasreporter.com: A ex-prefeita Maria José dizia que era “amiga pessoal” do ex-presidente Lula. Por que essa amizade não ajudou em nada a ZPE? Ou ajudou e a gente não sabe?
Arlindo Matias: Olha, o oportunismo político associa coisas inascíveis. Quando se fala em pedido pessoal para tirar a ZPE da gaveta, surge inúmeras versões…, a que eu sei e sou testemunha ocular através de reuniões em esfera nacional para se discutir o modelo ZPE, através da ABRAZPE – Associação Nacional das Zpes, é que a retirada da gaveta e a modernização deste mecanismo teve o pedido especial do Sarney, e o Lula não teve como não atender. Além do mais, tem-se o histórico deste mecanismo ter sido engavetado pelo Henrique Fernando Cardoso. Agora, tornar isto público em palanque e associar a um pedido especial para favorecer A ou B faz parte da jogatina política, principalmente em período eleitoral… A minha opinião é que mesmo assim existe o lado positivo. As Zpes estão aí, com uma legislação atualizada e modernizada para a indústria nacional e mundial. O próximo desafio é saber ir buscá-las, ser ousado e ter ideias… O que se vê é que a atual administração ao menos tem mais ousadia.
minasreporter.com: E quanto ao senador Aécio Neves? Acredita que ele, caso seja eleito presidente da República, pelos laços que tem com a região, ajudaria a ZPE a se tornar uma realidade?
Arlindo Matias: Qual o histórico dele na questão ZPE?… Eu o digo: foi colocar a Dorothea Werneck à frente da Secretaria de Desenvolvimento do Estado e ela ser ferrenha opositora e uma das que engavetou o mecanismo ZPE enquanto ministra do Fernando Henrique Cardoso. Agora, temos alguns compromissos firmados por Aécio e Anastasia aqui. Vejamos: entrevista de governador (hoje no Senado), “…Os investimentos já foram feitos… é um compromisso nosso… O governador Anastasia vai em pouco tempo implementá-la… ”. Entrevista do governador (atual) “…Sabemos dos nossos compromisso… é compromisso também do nosso governo do Estado…estou apenas aguardando o parecer da Advocacia Geral do Estado…” Entrevista do Vice-governador: “saímos da retórica para uma realidade. Eu venho colocar como propósito e uma determinação de governo, buscaremos isso…”. Entrevista do secretario Gil Pereira: “… a determinação do governador desde o primeiro dia do mandado para que realmente fosse comprada 51 % das ações… os recursos já estão disponibilizados para a compra…” Bom, o que esclarecer depois disto? Quem ousa falar? Continuei a buscar por uma parceria institucional, e o governo do Estado/Município ainda é o melhor parceiro para se fazer representar lá fora e fazer política institucional. Na condição de presidente, vindo a assumir, espero que não volte atrás em seus compromissos firmados nesta cidade.
minasreporter.com: Partamos do pressuposto de que a ZPE não saia do papel – pelo menos por enquanto. Aquele espaço não poderia receber alguma utilização prática em prol da economia, um distrito industrial, por exemplo, talvez irmanado à Zona Franca de Manaus, ou algo dessa natureza?
Arlindo Matias: Volto a dizer: não tem o que sair, tem o que entrar, principalmente com respeito às commodities locais, os tais arranjos produtivos. Entrar com projetos que podem ser financiados pelo DNDES, BNB, BB, BDMG e BIB… estes bancos estão aí com linhas específicas para este tipo de desenvolvimento. Agora, temos que fazer o dever de casa e ir buscar isto. É bom que se leve em consideração as diferenças de mecanismos. ZPE é um modelo que privilegia a produção partindo da cadeia produtiva e agregando valor ao seu produto. Zona Franca é um mecanismo de montagem de produtos industrializados… Ambos apresentam facilidades tributárias, mas não se confundem em sua prática. Quanto ao espaço, a área da ZPE hoje pertence ao Município, que dará o destino conforme sua conveniência.
minasreporter.com: Levando em consideração todos os entraves existentes, o que a direção da ZPEX, o Governo Municipal e a classe empresarial de Teófilo Otoni podem fazer para ajudar a ZPE a se tornar uma realidade?
Arlindo Matias:: o mecanismo ZPE sempre precisou de adequações e de modernidade mediante novos interesses dentro da necessidade de mercado. Isso sempre será necessário. O que fará a ZPEX sob o comando acionário da Prefeitura?… Espero que seja política pública de fortalecimento da economia local e regional em sintonia com o setor privado. Distorções sempre haverá. Ajustá-las é o grande desafio.
minasreporter.com: Fique à vontade para as suas considerações finais:
Arlindo Matias: Finalizando, agradeço esta oportunidade e continuo sempre à disposição para trocar informações com todo aquele que se interesse por este assunto – além das especulações e fantasias que foram criadas no sentido de desmerecer este mecanismo. Hoje estamos aqui completando um ano falando para outros países que o Brasil tem este modelo para o aporte industrial. Nossa parceria com a Abrazpe, 5C Group e UFM – Unior Force Marine, e câmaras de comércio na comunidade europeia, aqui na Alemanha, nos oportuniza ver que este modelo ainda é atual. Não fosse isto os EUA não estariam buscando uma cooperação bilateral com a Europa para se criar a maior Zona de Livre Mercado do Mundo.
Sucesso para os amigos do Minas Repórter! E logo-logo estarei aí com vocês. Um grande abraço e um muito Obrigado!
(entrevista originalmente publicada em janeiro de 2014)