O Brasil começa a pagar hoje a conta pela política de preços da Petrobras, que resultou na maior greve de caminhoneiros da história, interrompendo por 10 dias o transporte de cargas e mercadorias no território nacional. Se em 3,4 milhões de menções pelo Twitter a greve dos caminhoneiros conquistou, ao longo da última semana, o centro do debate político do Brasil – segundo aponta Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas, só ficando atrás este ano do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a morte da vereadora Marielle Franco (Psol).
Na economia, o balanço dos prejuízos é longo no curto prazo, incerto no médio prazo e tem potencial para se tornar devastador no longo prazo: com a perda da confiança do investidor e negócios que seriam, mas devido à insegurança, não mais serão concretizados. Sobre a sociedade recairão as consequências de cortes em programas sociais, saúde, educação. E sobre o empresariado – e a recuperação de empregos – a reoneração da folha de pagamento de alguns setores produtivos, além de cortes no programa de incentivo fiscal aos exportadores, o Reintegra.
Segundo projeções do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas, a greve vai provocar recuo de cerca de 0,3% na previsão inicial de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) deste ano, que seria de 2,3%. De imediato, os setores que divulgaram os seus números exibem perdas estimadas entre R$ 75 bilhões e R$ 100 bilhões, com a fatura mais pesada lançada sobre o agronegócio, o mesmo que protagonizou o maior impacto positivo sobre o PIB de 2017. Isto porque neste setor houve quebra da cadeia produtiva: 100 milhões de aves mortas, 120 mil toneladas de carne de frango e suína deixaram de ser exportadas, 300 milhões de litros de leite descartados, 98% das plantas de produção de carne do país foram interrompidas. Ato contínuo, o agronegócio foi abatido em algo próximo a R$ 14 bilhões.
O Brasil, dependente do modal rodoviário, parou. O setor têxtil estima baixas de R$ 1,8 bilhão e na indústria automobilística quase todas as fábricas interromperam a produção. A Confederação Nacional de Dirigentes Logistas (CNDL) calcula prejuízo de 27 bilhões de reais; com a interrupção de obras, a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), avalia perdas de R$ 2,9 bilhões; e com a paralisação da movimentação econômica, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) estimou em R$ 32,5 bilhões o impacto negativo dos nove dias da crise dos combustíveis para a economia nacional.
União, estados e municípios – que enfrentam dramático desequilíbrio fiscal – deixaram de arrecadar R$ 4,7 bilhões: a arrecadação tributária sobre gasolina, diesel e álcool representa 5% da arrecadação total do país. Para Minas Gerais, os economistas da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) estimam impacto negativo de R$ 874,3 milhões no recolhimento do ICMS, dos quais, R$ 538 milhões só na indústria. Em Minas, as perdas em valor adicionado somam R$ 11,9 bilhões, dos quais, R$ 2,4 bilhões na indústria, segundo dados da Fiemg. Mas as projeções deverão aumentar, pois ainda há desdobramentos para registrar nos setores industriais que operam em regime just in time, no qual os estoques de matérias-primas são planejados para suprir a produção por dois ou três dias.
Investimentos prejudicados
“A crise, do ponto de vista econômico, foi uma catástrofe e a apreensão gerada inibe empresários para novos investimentos. Quando colocamos medo e incerteza no cenário, diminui a probabilidade de crescimento do país”, avalia o presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais, Flávio Roscoe. “Isso é igual a um trauma. Fica no subconsciente. Qual será a reação da comunidade industrial? Com certeza não é positiva, pois se viu a fragilidade do país. E no ímpeto de investir, pessoas querem acreditar que vai dar tudo certo. Se perdem essa crença, perdemos a capacidade de crescer”, diz Roscoe.
Para interromper a sangria provocada pela greve dos caminhoneiros, o governo Temer não confrontou o mercado: manteve a política de preços praticada pela Petrobras – indexada ao dólar e ao preço internacional da cotação do óleo cru. Preferiu lançar sobre os ombros da sociedade a conta estimada em R$ 9,6 bilhões, resultado da redução de R$ 0,46 por litro de diesel na bomba. No pacote de natureza tributária, o governo eliminou a cobrança da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre o diesel (R$ 0,05) e reduziu a alíquota de PIS/Cofins (R$ 0,11). Virão do Tesouro Nacional os outros R$ 0,30. Ficam prejudicados os investimentos em infraestrutura de transportes e projetos ambientais relacionados à exploração do petróleo e gás, aos quais se destinam a Cide.
A reoneração da folha de pagamento de setores produtivos e os cortes no Reintegra – programa de incentivo fiscal aos exportadores, vai diminuir de 2% para 0,1% o montante a ser devolvido, ambos com consequências sobre a recuperação do emprego. Somam-se à redução de programas nas áreas de saúde, na educação e saneamento básico (especialmente em comunidades ribeirinhas), além de moradia popular, policiamento ostensivo em rodovias federais, entre outros programas sociais, como para a agricultura familiar.
Os caminhoneiros, por seu poder de pressão – respondem por 60% de toda carga transportada no continental território brasileiro – alcançaram os seus pleitos justos: além de trabalhar de forma precarizada, enfrentaram nos últimos 11 meses reajuste de 56% do diesel nas bombas, em aumentos registrados até cinco vezes por semana. Tamanha flutuação nos preços retirava qualquer previsibilidade no planejamento dos fretes. Mas, a população, em geral, que circula com a gasolina, não teve a mesma sorte. Recebe em reais, mas continua refém das oscilações do dólar e à volatilidade do preço internacional do petróleo. Tanto é que, encerrada a greve, já enfrenta o segundo aumento consecutivo nos postos: em menos de dois meses, já subiu 16%.
(Fonte: Bertha Maakaroun – Estado de Minas)