Conheça a situação da rodovia MG-280, considerada uma das três piores do estado

Conheça a situação da rodovia MG-280, considerada uma das três piores do estado

Lista de rodovias estaduais com restrição de tráfego muda a cada temporada, mas três delas, todas sem asfalto, sempre figuram entre os mais desafiadores caminhos que cortam o estado.

Água Boa, Alto Rio Doce, Carmésia, Dores do Turvo, Malacacheta, Morro do Pilar e Paula Cândido – Os pneus do ônibus não têm mais nenhuma ranhura; rodam carecas, porque o motorista diz não valer a pena trocar de 15 em 15 dias e ter a borracha dilacerada pelas pedras afiadas e buracos do caminho. A porta ficou sem o vidro quando o condutor tentou desviar de uma cratera e atingiu um galho de árvore que não foi podado. Por causa do impacto, agora a porta só abre se alguém empurrar, e por isso muitas viagens são feitas com o vão aberto. O mesmo tipo de avaria deixou uma trinca de fora a fora no para-brisa. Na lataria, cada amassado e rombo conta a história de uma batida no barranco, fruto de escorregamentos na época das chuvas. A aventura de se trafegar pela MG-280, entre Dores do Turvo e Alto Rio Doce, na Zona da Mata, desencoraja a maioria a cumprir o trajeto, devido aos custos de manutenção e aos perigos iminentes, mas, no caso desses coletivos, parar não é opção. Neles, em vez de passageiros comuns são transportados 60 estudantes que dependem do veículo precário para chegar às salas de aula.

Veículos como os ônibus escolares, que precisam trafegar com frequência pela MG-280, na Zona da Mata, exibem na lataria as marcas da batalha (Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press)
Veículos como os ônibus escolares, que precisam trafegar com frequência pela MG-280, na Zona da Mata, exibem na lataria as marcas da batalha (Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press)

A saga desses alunos mostra os perigos pelos quais passa quem depende para sobreviver de rodovias que traçam pelo estado o mapa dos piores caminhos mineiros, retratados pelo Estado de Minas desde a edição de ontem. À primeira vista, a MG-280 – um caminho estreito de terra batida com buracos tão grandes que chegam a engolir as frentes de caminhões, valas tão fundas quanto degraus, pontes reparadas à base de improviso e muitos atoleiros – não parece uma rodovia. Mas é uma ligação primordial entre as regiões da Zona da Mata e dos Campos das Vertentes, por onde trafegam cerca de 700 veículos diariamente, razão de um a cada 2 minutos. Pode parecer pouco, mas o fato é que muita gente procura desvios para evitar as armadilhas da via, mesmo que praticamente tripliquem a viagem.

Mas, no caso de estudantes do ensino médio, não há escapatória, principalmente para os que moram no distrito de Abreus, que tem 2.200 habitantes e pertence a Alto Rio Doce. A MG-280 é o único meio que têm para chegar à escola estadual na sede do município. A viagem de 18 quilômetros dura uma hora, e em raros momentos o motorista Júlio Ribeiro de Souza, de 42 anos, consegue encaixar a terceira marcha – mesmo porque, a embreagem está tão impregnada de poeira que praticamente perdeu a função. “Já fiquei atolado aqui o dia inteiro, em uma situação em que nem trator conseguia tirar o ônibus. Os alunos acabam chegando atrasados. Tem dia que os professores não deixam os meninos entrar e a gente precisa intervir. Já falei para terem paciência com os moradores de Abreus, porque não tem outro caminho: são duas horas de ida e volta para fazer 36 quilômetros”, conta. O número crescente de reparos faz com que o ônibus precise rodar com muita precariedade, segundo o condutor. “Todos os dias tenho de dar alguma manutenção”, afirma.

A situação desses estudantes ilustra as dificuldades do trecho. “A viagem é péssima. Demora demais. A gente estava saindo de Abreus às 6h15, mas como sempre chegávamos atrasados, passamos a sair às 5h50, ainda no escuro. Sacode muito, é cansativo e chegamos exaustos lá (na escola). Nem dá vontade de ir à aula”, reclama Laís Faria Ribeiro, de 15. “Uma vez, a gente teve de voltar na carroceria de um caminhãozinho, porque tinha muito barro na estrada. Foram duas viagens para o caminhãozinho trazer todos de volta para casa. E ainda corremos muito risco de acidentes. O ônibus viaja tão cheio, que fica gente em pé, se segurando”, conta Jobert Aparecido Martins, de 16.

O motorista Júlio Ribeiro não acredita que tão cedo a situação vá melhorar. “Conforto? O conforto aqui é o mesmo de andar em carro de boi. Patrolamento e encascalhamento não adiantam mais, porque não duram mais de um mês. Essas máquinas que trazem só servem para comer dinheiro. A solução aqui é só uma: asfaltar.”

Em alguns trechos da MG-280, só tratores passam, e mesmo assim com dificuldade (Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press)
Em alguns trechos da MG-280, só tratores passam, e mesmo assim com dificuldade (Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press)

A listagem de rodovias estaduais interrompidas ou com restrição de tráfego muda a cada temporada, quando caem barreiras, pontes cedem ou drenagens danificadas causam erosões. Mas, nessa relação do Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG), há três estradas – entre elas a MG-280 – nas quais nada de excepcional precisa ocorrer para que se transformem em desafios ao tráfego. Completam a lista dos piores caminhos do estado, na avaliação de especialistas e da população que cobra asfaltamento nos fóruns estaduais regionais mineiros, as rodovias MG-217 (Água Boa-Malacacheta) e MG-232 (Morro do Pilar-Carmésia). São vias que impõem castigos contínuos e avarias aos veículos, impedem o escoamento da produção agropecuária, tiram estudantes das salas de aula, isolam regiões inteiras, impedem tratamentos de saúde e emergências médicas. Para mostrar essa realidade, a reportagem do Estado de Minas percorreu vias que em certos casos são a única opção de tráfego para as comunidades que deveriam atender.

(Estado de Minas)

 



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