Mulher que tinha clínica clandestina no Bairro Caiçara foi apresentada nesta quinta-feira. Profissionais encaminhavam pacientes e médico disse ter permitido entrada dela em uma maternidade. Foram pelo menos 120 abortos desde 2012.
Uma grande cadeia de pessoas, envolvendo médico e farmacêuticos, é suspeita de envolvimento em um esquema de abortos descoberto pela Polícia Civil em Belo Horizonta. A responsável pelos procedimentos, segundo as investigações, é Ilizabete Alves Menezes, de 69 anos, presa em 9 de março. Pelo menos 120 abortos realizados na capital são atribuídos a ela, mas existe a suspeita de que a mulher agisse desde a década de 1970. A mulher foi apresentada nesta quinta-feira.
Foram indiciados pelo crime de formação de quadrilha Jaqueline Alves Menezes e Marcelo Alves Menezes Ferreira, filhos de Ilizabete, além de Jaildo Souza dos Santos. Todos foram denunciados pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). Marcelo e Jaildo são considerados foragidos, pois têm mandados de prisão contra eles.
Segundo o delegado Rodrigo Bossi, o caso começou a ser investigado na Corregedoria da Polícia Civil, que apurava o caso de um ex-policial que teria procurado a acusada para interromper a gravidez de uma companheira. Em 20 de janeiro a corregedoria interceptou uma ligação confirmando um aborto.
De posse de um mandado de busca, a equipe foi até a clínica clandestina, no Bairro Caiçara, Região Noroeste de Belo Horizonte. Médica e paciente estavam no local, mas não houve flagrante, já que o procedimento não chegou a ocorrer. No local foram encontrados vários equipamentos usados por ela. Entre os medicamentos que também foram apreendidos estava o Cytotec, proibido no país. O caso foi repassado à Delegacia de Homicídios.
No local também foi encontrado um caderno com anotações que datam de março de 2012. “Ela anotava todas as ligações que recebia por dia e contabilizava todos os abortos que fazia, com nomes das pessoas, quem indicava, médicos que consultou, exames que fez, tempo de gravidez”, explica Rodrigo Bossi. “A partir daí, só pela leitura do caderno, descobrimos várias mulheres que supostamente teriam feito abortos. Contabilizamos 120 desde março de 2012.”
Por meio do caderno a polícia conseguiu identificar duas mulheres que foram até a delegacia e confessaram ter abortado com ajuda da acusada e apoio dos respectivos parceiros. Elas foram indiciadas por aborto consentido, assim como os homens, como cúmplices do crime. “Descobrimos uma ampla cadeias de pessoas que são partícipes, como médicos e farmacêuticos. A maioria arregimenta as mulheres. Só um foi identificado”, diz Rodrigo Bossi.
De acordo com o delegado, inicialmente Ilizabete disse aos investigadores que era registrada no Conselho Regional de Medicina e que estudou na Universidade Federal Fluminense. “Mandamos informações para o Conselho do Rio, que informou não ter registro dela. A universidade confirma que ela nunca estudou lá”, afirma Bossi.
Ilizabeth foi indiciada por dois crimes de aborto (referentes às mulheres que confessaram), formação de quadrilha, exercício ilegal da medicina e distribuição de medicamento ilegal – o mais grave, segundo o delegado –, cuja pena pode chegar a 15 anos.
As investigações mostram que os abortos aconteciam dentro da clínica, mas um dos detalhes mais graves é de que alguns procedimentos médicos eram realizados dentro de uma maternidade de BH. “Ela fez exames dentro de um hospital. Nessa cadeia de pessoas há médicos e farmacêuticos. Para fazer um exame de ultrassom ela precisava dessa ajuda”, explica Rodrigo Bossi. “Um médico, em outro processo, disse que a recebia com pacientes dentro do hospital.” A investigação corre em sigilo.
ALERTA As investigações prosseguem agora na Delegacia Regional Noroeste, na tentativa de identificar mais mulheres. Rodrigo Bossi diz que a apuração vem resguardando as suspeitas, entrando em contato com elas por telefone ou internet para preservar a imagem. “O risco social da divulgação disso é muito mais prejudicial do que a pena advinda do processo. Elas vão ser processadas e no final, condenadas, vão ter pena de prestação de serviço comunitário ou pagar cesta básica. É muito pequena em comparação com o risco social”, detalha Rodrigo Bossi.
“Como nos cadernos há todas as ligações por dia, quantos abortos, quando quebrarmos o sigilo vamos identificar todas as mulheres. É inevitável”, diz. Assim, para evitar que a polícia precise contatar parentes, companheiros, amigos e vizinhos das mulheres que aparecem na lista, o policial pede que elas procurem espontaneamente a Delegacia Regional Noroeste.
( Estado de Minas)