Militantes menos sofisticados da esquerda costumam achar que só eles defendem os pobres, os negros e os gays. Por isso não conseguem entender o mais jovem vereador de São Paulo
Por: Leandro Narloch
VEJA.com
“Como pode um homem gay, negro e pobre ser de direita?”
A esquerda voltou a se debater com essa pergunta desde a vitória de Fernando Holiday na eleição em São Paulo. Aos 20 anos, o rapaz foi o 13º candidato mais votado a vereador.
Há respostas das mais variadas. “Ele encarnou um capitão do mato; é um negro contra os negros”, diz a explicação mais comum. Um daqueles sites patrocinados pelo governo Dilma solucionou a questão com uma sacada criativa: concluiu que o rapaz, na verdade, não é negro, pois “ser negro não é uma condição dada, a priori. É um vir a ser”. Pronto, um problema a menos, Fernando Holiday é branco!
A esquerda não consegue entender a existência de Holiday porque acredita ter o monopólio da defesa dos negros, pobres e “oprimidos” em geral. Se um negro luta contra a esquerda, então há algo de errado com ele. Ou não seria realmente negro ou teria algum problema psicológico, uma anomalia que o faria agir contra a própria identidade. Oras, se a esquerda está do lado do povo, por que o povo estaria contra a esquerda?
Militantes mais embrutecidos acreditam também que para beneficiar os pobres é preciso prejudicar os ricos (com impostos sobre fortunas, por exemplo). Por isso um negro e pobre jamais se alinharia a partidos dos ricos. Mas Fernando Holiday, um liberal, é contra a ideia do conflito irreconciliável entre as classes. Acredita que a prosperidade beneficia tanto pobres quanto ricos, e que ideias econômicas de esquerda prejudicam todos, incluindo gays e negros.
Há ainda um terceiro motivo. Assim como a direita mais tacanha, a esquerda menos sofisticada gosta de achar que seus adversários se resumem a estereótipos ridículos ou políticos radicais. A direita seria apenas a senhora racista da praia do Rio de Janeiro, o empresário engomado que se incomoda com pobres no aeroporto, o deputado-pastor contrário ao casamento gay.
É mais confortável, para militantes da esquerda, ignorar a existência de adversários com mais nuances. O rosto de Fernando Holiday, um gay, negro, defensor de privatizações e antipetista radical, não poderia ser mais indigesto.
@lnarloch