Depois de um desembolso bilionário de quase US$ 15 bilhões para erguer o maior projeto de mineração integrado com ferrovia do mundo, a Vale, líder global do setor, vai adotar uma estratégia menos agressiva de investimentos no curto prazo. O foco principal agora é tratar bem o mercado financeiro, remunerando melhor os acionistas, disse o presidente da companhia, Fabio Schvartsman, à Agência Estado. Afetada pela pior crise de sua história – o rompimento da barragem da Samarco, em Mariana, em 5 novembro de 2015 –, a gigante brasileira, sócia na empresa com a australiana BHP, tenta retomar a operação no local. Schvartsman afirma que tudo vai ser reconstruído.
Quais são os planos de expansão da Vale?
A Vale vive um momento especial, que é a combinação de um cenário global excelente do minério de ferro e uma oportunidade futura para desenvolver a área de metais básicos. A volatilidade dos preços do minério diminuiu. A Vale já está bem posicionada em matéria-prima de alta qualidade, com o projeto de Carajás (S11D).
Diante desse cenário, quais serão os futuros investimentos?
Antes de responder a essa questão, temos de lembrar que a Vale concluiu um grande investimento. Vamos limitar a nossa produção anual a 400 milhões de toneladas de minério. Nossa capacidade é de 450 milhões. Essa reserva será usada se os preços do minério voltarem a subir. A Vale viveu o superciclo. Mas, no fim do dia, foi um desastre para as empresas.
A Vale cogitou a aquisição da Xtrata durante o superciclo..
Não só a (anglo-suíça) Xtrata, mas a (canadense) Alcan. Fizemos a aquisição da Inco, de níquel e cobre (no Canadá). A Vale entrou sem se dar conta de que não entendia nada do assunto. Minério de ferro é um negócio de logística. Escala é importante.
Mas a Vale ainda sofre pressão para comprar ativos?
Mudanças a gente faz logo que entra. A principal que fiz (o executivo assumiu em maio de 2017) não foi só a do prédio (da sede da Vale), mas de governança. A única maneira de conseguir tornar a empresa melhor é que ela não esteja sujeita a pressões inadequadas.
Quais seus planos para a Vale, considerando as dificuldades de obter licenças?
Acreditamos que, neste momento, é muito importante tratar bem o mercado acionário. Vamos pagar dividendos polpudos a partir de uma política agressiva que já rendeu US$ 2 bilhões aos acionistas (já aprovada), que veio para ficar. Além disso, separamos US$ 1 bilhão para recomprar ações da Vale.
Por que esse movimento?
Queremos dar segurança e previsibilidade para quem comprar as ações. A Vale tem de ser mais previsível.
Mas não era assim antes?
A Vale prometeu de mais e entregou de menos. Essa é a diferença. Temos de ser transparentes e a governança é importante. Sem a figura de um controlador (que deixou de existir com a reestruturação societária em 2017), a influência de um terceiro fica muito menor. Aqui não tem mais controlador. Quem decide é um conjunto de acionistas.
O que a empresa tinha prometido e não entregou, por exemplo?
A Vale teve um período de euforia com o superciclo, quando todos os minérios atingiram preços estratosféricos. Só que depois da euforia veio a depressão (dos preços). A Vale tentou prometer que iria entregar resultado, mas como o cenário continuou ruim, não entregou. Tem de prometer em cima de fatos.
Como se faz isso?
Criando valor ao negócio, como fizemos. Temos um tipo de minério, que já é referência, baseado na mistura de matéria-prima de baixa qualidade com a de alta qualidade. Já produzimos cerca de 100 milhões de toneladas desse minério, de um total de 400 milhões de toneladas da nossa produção.
As vendas de ativos foram concluídas?
Sim. Depois da governança, foi um dos nossos melhores programas. Ajudou a reduzir a dívida pela metade nos últimos 12 meses, de cerca de US$ 22 bilhões para US$ 11 bilhões. Resultado de uma combinação de desinvestimento e melhoria das operações.
E os novos investimentos?
A estimativa é de US$ 8 bilhões entre 2019 e 2020. A Vale só fará investimentos onde tiver retorno. Não iremos diversificar no curto prazo. Agora é fazer crescimento orgânico e pequenas aquisições que façam sentido aos nossos projetos. Vamos desenvolver projetos em níquel e cobre, por exemplo.
Fora do país?
Não. Nossas reservas estão basicamente no Brasil, que é o grande mercado da Vale.
Por isso voltou a fazer campanha de marketing?
A Vale é uma empresa extremamente importante para o Brasil. E o Brasil extremamente importante para a Vale, especialmente em Minas Gerais, Pará, Espírito Santo e Maranhão, onde está o grosso das nossas operações. A diretoria da Vale entende que é obrigação da companhia cuidar bem das comunidades do entorno. A Vale sempre fez bem o que ela se comprometeu a fazer. Só que queremos ir além.
Mas há uma crise de imagem após o acidente da Samarco…
A Fundação Renova (Samarco, Vale e BHP) tem feito um trabalho excelente, mas abriu mão do direito de defesa. Foi um desastre. Ninguém fez isso de caso pensado. Um acordo (com Ministério Público Federal e outras autoridades) foi fechado, mas o processo é lento. Temos o compromisso de reparar tudo.
Será o seu legado recuperar essa imagem?
Prefiro dizer que quero que a Vale se torne referência de sustentabilidade no Brasil e no mundo. Que haja claríssima recuperação de valor na companhia. Quanto mais valiosa a Vale, melhor para seus acionistas e empregados e para o país.
As incertezas eleitorais preocupam a Vale?
Em primeiro lugar, a Vale vai ter de trabalhar com qualquer governo, independentemente de quem for eleito. Tudo o que a Vale faz depende de concessões, portanto, tem relação com o governo. Não há a menor dúvida. E tem de ser uma relação natural.
(Fonte: Estado de Minas)