Exames de direção monitorados por quatro câmeras e sistema de telemetria capaz de registrar uma lista de possíveis falhas no comando dos carros; redução do poder do examinador do Detran para avaliar o desempenho do candidato a motorista – e consequentemente da margem para decisões arbitrárias e eventuais desvios –; possibilidade de diminuição do número de examinadores envolvidos nos testes de direção. A lista de notícias aparentemente positivas para quem sonha com a carteira de habilitação em Minas – e tem como pesadelo um processo que reprova sete de cada 10 candidatos à categoria mais procurada no estado – vem acompanhada de uma informação não tão animadora: o preço do avanço tecnológico vai para o bolso do aspirante a condutor.
A precisão da tecnologia de câmeras e da notificação eletrônica de falhas contra a subjetividade da avaliação dos examinadores promete ser a nova realidade dos exames de direção a partir deste ano. O Detran/MG espera que em quatro meses, contados a partir do fim de um período de testes que ainda deve levar cerca de 30 dias, todos os cerca de 1.720 centros de formação de condutores mineiros ofereçam o novo serviço. Ele será obrigatório e na prática representa a filmagem de todos os exames e aulas de direção, além de um sistema que consegue identificar eletronicamente erros praticados pelos candidatos.
Para um sistema que com frequência se vê questionado pela subjetividade do olhar do examinador e às vezes até por relatos de corrupção, o Detran aposta em mecanismos objetivos que retratem o que de fato acontece dentro dos veículos durante o exame. Para o departamento, isso pode até aumentar o percentual de aprovação nos quase 2,2 mil testes de direção que ocorrem todos os dias no estado. Em média, mais da metade dos candidatos às 905 mil provas de rua foram reprovados no ano passado, levando em consideração todas as categorias de habilitação. Considerando-se só a categoria B, dos carros de passeio, a aprovação se restringiu a 30% dos 651 mil exames do ano passado no estado. Além disso, o Detran ainda acredita que o novo sistema aponta para uma diminuição do número de examinadores dentro dos carros, já que hoje são dois que avaliam os candidatos. A perspectiva é que a tecnologia possibilite a redução para apenas um, liberando policiais para outras atividades.
O novo sistema representará um custo extra, devido ao serviço prestado pelas empresas que se credenciaram para oferecer a tecnologia. O valor será cobrando das autoescolas, que tendem a repassá-lo aos consumidores. O Detran argumenta que suas taxas continuarão as mesmas e o percentual de aumento será baixo, perto do benefício da tecnologia para a população. “O valor é ínfimo, considerando o investimento para aumento da segurança e preservação da vida”, diz o delegado João Marcelo de Paula Loureiro, coordenador de Administração de Trânsito do Detran.
Ontem, ele esteve acompanhado do diretor-geral do departamento, César Augusto Monteiro, e do chefe da Divisão de Habilitação, Ednelton Carraci, para apresentar a novidade. “Diminui consideravelmente a abertura para subjetividade. Os exames têm que ser feitos em cima de critérios objetivos. Nesse tipo de sistema, o que acontece é que, além do vídeo, teremos embarcado um sistema de tecnologia que notificará cada falha. Se a pessoa não colocou o cinto de segurança, não deu seta ao sair, deixou o motor do veículo morrer, isso tudo aparecerá nos tablets como notificações. Ali estará todo o critério objetivo”, diz José Marcelo de Paula Loureiro.
REVERSÃO DE RESULTADOS
O diretor-geral do Detran/MG, delegado César Monteiro, admite a possibilidade até de uma mudança de resultados em exames de habilitação caso as imagens comprovem prejuízo aos candidatos. Segundo Monteiro, quem se sentir prejudicado pode fazer uma solicitação ao Detran, que vai providenciar auditoria nas imagens por meio de uma comissão. A programação para implantação do novo sistema inclui um período de testes que vai ocorrer em Nova Lima, na Grande BH, e deverá estar concluído dentro de um mês. Antes disso, o órgão pretende divulgar um cronograma de ampliação, pois as autoescolas terão 120 dias após o fim dos testes para oferecer o sistema de forma obrigatória, sob pena de descredenciamento.
Categoria B pode partir de R$ 2,3 mil
Se o sistema tem o objetivo de livrar o candidato da subjetividade do examinador, não deve livrá-lo do custo, nem da burocracia. Com as novas regras de monitoramento, tirar a carteira de motorista vai pesar ainda mais no bolso – entre 5% a 8% de acréscimo no preço final, segundo estimativa dos donos de autoescolas. Para quem estiver de olho na possibilidade de clareza do processo de habilitação em caso de dúvidas, a transparência vai, certamente, esbarrar em prazos, requerimentos e análises. Novas regras para exames de motos ainda são esperadas.
O Sindicato dos Proprietários de Centros de Formação de Condutores do Estado de Minas Gerais (Siprocfc-MG) afirma que o custo só não será maior porque a implantação do sistema de monitoramento será feita por meio de comodato. As autoescolas mineiras vão pagar um aluguel às empresas contratadas pelo serviço – todas credenciadas pelo Detran – pelo uso dos equipamentos nos 13 mil veículos da frota.
De acordo com o presidente da entidade, Alessandro Dias, o preço da habilitação categoria B, para carro, que hoje gira em torno de R$ 2,2 mil (da legislação à prova prática, incluindo exames e taxas), deve passar à casa dos R$ 2,3 mil. Na categoria A, para motos, cujo processo de habilitação tem valor médio de R$ 2,1 mil a R$ 2,2 mil, o sindicato aguarda a definição das regras. “O impacto pode ser um pouco diferente. Como as negociações não fecharam, não há estimativa. Não se sabe se terá câmera na moto ou sensor na pista”, diz.
Alessandro Dias afirma que as normas já eram esperadas e estavam sendo discutidas há algum tempo. Para ele, mudanças significam melhor formação. “Elas têm o objetivo de dar transparência aos questionamentos relativos a aulas e exames: se o instrutor não seguiu o tempo todo da aula, se há dúvidas em relação a seu comportamento ou do examinador. O impacto será grande, pelo fato de aulas e exames serem monitorados em vídeo e áudio, com sensores apontando os comandos que foram feitos”, diz.
Mas, o caminho será longo para quem quiser testar a transparência. As imagens serão geridas exclusivamente pela empresa contratada, informa o sindicato. Se o candidato quiser usá-las para rebater uma reprovação, terá de requerer ao Detran, que vai solicitar à prestadora de serviço e, depois, analisará o material para se manifestar sobre a pertinência da queixa. “A empresa tem obrigação de manter o acesso do Detran ao armazenamento. Os dados não são liberados livremente. Os centros de formação de condutores têm acesso, mas dentro de regras bem definidas”, explica o presidente do sindicato.
(Fonte: Guilherme Paranaiba e Junia Oliveira – Estado de Minas)